Quando minha filha ficou grávida, durante o namoro do primeiro casamento, ela lecionava em Salto (SP), me telefonou desesperada, chorando, perguntei-lhe se havia morrido alguém. Por que tanto choro? Ela estava preocupada com a situação social de uma gravidez antes do casamento e eu com a vida. Assim, enfrentamos tudo na calma e deu tudo certo.
Não vou dizer que eu sou perfeito, o bom, mas sempre procurei trilhar pelos princípios cristãos, humanitários, embora o cristianismo tenha cometido barbaridades nos caminhos da história. Sempre comemorar a vida, lamentar a morte, principalmente aquela tirada com a força da violência, um ser humano matando o outro, por exemplo. Mas nem tudo acontece como a gente quer.
Apesar dessa minha formação, confesso que não senti piedade quando soube da morte de Lázaro Barbosa, o assassino em série de Goiás. Depois de tanta barbaridade cometida por ele, entrar vivo no sistema penitenciário significaria muito sofrimento. Ia ser morto na cela.
Alguns jornalistas sentiram a morte de Lázaro Barbosa porque classificaram-na como uma queima de arquivo. Ele tinha muito o que contar e revelar. Levou histórias estarrecedoras para o túmulo.
Como houve também gente ironizando o trabalho da polícia goiana, dizendo que apesar de tantos homens à caça de Lázaro Barbosa, com tanta tecnologia, quem promoveu mesmo a prisão, entregando o rapaz, foi a sogra do matador. E aí sobrou também para estragar ainda mais a imagem pública de uma das avós de nossos filhos..
De tudo isso, o que mais me chocou foi a polícia comemorar a morte de Lázaro como se tivesse num campo de futebol vibrando com o gol. Talvez não. Não sei se comemorou a captura, que se transformou num espetáculo midiático, com 38 tiros no corpo do assassino em série ou se estava mesmo alegre com a morte. Devo adiantar aqui que se eu fosse um policial, naquela situação, não teria feito diferente, é a teoria do homem e suas circunstâncias.
Na verdade, o objetivo dessa minha crônica é expor a contradição entre barbárie e civilização. Vivemos tais conceitos antagônicos diante da vida, o objetivo é ir diminuindo a barbárie do caminho da humanidade, eliminá-la de vez é quase impossível.
Barbárie e civilização revelam a condição e estrutura de uma sociedade. A barbárie é o estado de caos, desordem, sem uma cultura padrão de convívio entre os indivíduos, tornando-os seres humanos ainda mais cruéis, violentos e ignorantes. Civilização tem princípios, está sob o domínio da ética e da democracia. Ela é resultado da evolução antropológica, aceita a existência do contraditório, construindo uma cultura de paz.
A família é a primeira grande formadora de cidadãos, depois a escola. Não estou falando apenas de família tradicional, nela aprendemos a ser unilaterais ou multilaterais. Por aí deixamos de ser bárbaros ou civilizados.
Lázaro Barbosa era selvagem, rude (bárbaro), e foi morto por uma polícia estressada, bárbara. Precisamos todos nos civilizar.
*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro das academias de letras de Araçatuba-SP, Andradina-SP e Itaperuna-RJ