A minha vida é formada por livros. Quando os descobri, usava as bibliotecas, mas eu queria tê-los, formar minha biblioteca. E assim fui lecionar Português numa cidadezinha que não havia biblioteca pública. Os parcos livros do professor andavam de mão em mão.
Os meus primeiros salários eram gastos em livros, numa livraria de Presidente Prudente, Livrolândia. Já que não havia livraria na cidadezinha, não existia internet para comprá-los, o remédio era esperar a próxima viagem. Livro digital era ficção científica.
Ler e analisar os livros foi minha primeira fase. Bem mais tarde, apareceu a outra: escrevê-los. Publicá-los. Quem vai bancar a publicação. Aí descobri, caro leitor, que a maioria dos escritores começam pagando as primeiras edições. Aqui no interior, eu continuo pagando até hoje.
O meu primeiro livro foi emocionante, vê-lo na estante com o meu nome na lombada. Ao lado do Machado de Assis, Miguel de Cervantes. Se eu ia conseguir pagar a edição, discutia-se depois. Faz-se a noite de lançamento e não arrecada o suficiente, vende um aqui, outro ali. E os boletos chegando.
E os amigos perguntando: "Quando você vai lançar outro livro?" Aquilo me dava coceiras. Mal sabia quão sacrificado era publicar um livro.
Um bando de malucos resolve formar uma academia de letras na cidade. Vou ser imortal. Só quando entrei é que descobri que são imortais porque não têm onde cair morto, pobretões dando uma de bacana. Eu era mais um. Paga-se a imortalidade mensalmente. Mais despesas.
E a família orgulhosa porque tem um escritor na família. Minha mãe, mais esperta, só deixou de resmungar quando passei a escrever no jornal e ganhar alguns trocados. Acabou a contrariedade da veinha.
Passei a publicar na internet, ter o meu blog, compartilhar meus textos com os amigos, passei a ser lido mais ainda, mas ouvia sussurros: "o Hélio bota um ovo diariamente, todo dia cai um texto no meu zap. Ele acha que não faço mais nada! Existo só para ler os textos dele".
Nem me incomodava, porque o artista não pode ter medo do ridículo. Quando aprendi isso, virei o maior cara de pau.
Publicar digitalmente não basta, porque o livro de papel é uma mídia enobrecedora. Se publica apenas em blog, não é escritor. Sempre vem a pergunta: "Quantos livros publicou"?
Não contente em publicar, inventei de editar livros para os outros. Comecei isso na Folha da Região. Nessa nova fase, aprendi que há gente que sonha publicar livros para ficar rico.
O cara escreveu 20 páginas e acha que escreveu um livro. "Quero escrever um livro da minha vida, assim deixo meu bom exemplo para os descendentes quando me leem". Quase respondo: economize árvores (papel é feito com árvores), meu caro, ninguém está querendo saber de sua vidinha medíocre.
Então, este maluco reuniu mais 24 do Grupo Experimental, cada um pagando R$50,00 em oito meses e estamos publicando uma coletânea, cada autor teve dez páginas. Chama-se Experimentânea 14.
O lançamento (não é foguete, mas é assim que se fala) será no Quintal Cultural, rua Cussy de Almeida, 2088, Araçatuba. Não se esqueça de levar R$ 30,00. E ainda vai ouvir músicas e declamações de poesias.
Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor
(Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião deste veículo de comunicação).