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A Promotoria do Patrimônio Público e Social de Araçatuba arquivou, na última quarta-feira (20), representação feita pelo advogado Lindemberg Melo Gonçalves, sobre eventuais irregularidades e até mesmo possível improbidade administrativa cometida pela administração municipal na compra de livros para a rede municipal de ensino, sobre meio ambiente, mediante dispensa de licitação. O fato se deu em dezembro de 2017, ao custo de R$ 1.795.450,00.
Conforme o procedimento de arquivamento do caso, determinado pelo promotor Luiz Antônio de Andrade, na representação, Lindemberg alega que estão ausentes no processo de compra requisitos para a inexigibilidade de licitação, por entender ele que a empresa contratada não detinha exclusividade no fornecimento do produto objeto da contratação, e que era dever da administração esgotar a avaliação de materiais similares de outras editoras.
A promotoria ainda observa, sobre a representação, que seu autor destaca que a pesquisa de preços foi precária e deficiente. Lindemberg alega, também, que não basta a declaração da Câmara Brasileira do Livro de que o material adquirido pela constitui publicação exclusiva da empresa contratada, pois o assunto de cada livro é amplo, podendo ser encontrado em publicações de outras editoras, e que os representados, no caso o prefeito Dilador Borges (PSDB); a secretária de Educação, Silvana de Sousa e Souza; e o secretário responsável pela pasta de Assuntos Jurídicos, Fábio Leite e Franco, beneficiaram a empresa contratada, que enviou orçamento à Prefeitura com o quantitativo certo de material a ser adquirido, o que seria indicativo da obtenção de informações privilegiadas
Na representação, o advogado ainda observa que os responsáveis pelo processo de compra não teriam apurado se havia necessidade de adquirir o material, pois a iniciativa havia partido da empresa, que encaminhou ofício com a oferta de seus produtos.
ARGUMENTAÇÕES
Ao proferir a decisão pelo arquivamento do caso, o promotor se amparou em informações prestadas pela administração municipal conforme solicitação sua. Não consta no documento assinado por Andrade se ele chegou a requisitar da Prefeitura de Araçatuba uma cópia dos kits de livros, dicionários e jogos que foram comprados, para uma análise mais aprofundada do conteúdo pela própria promotoria.
Conforme a peça de arquivamento, a Secretaria de Educação informou que os kits em questão foram comprados para contemplar a disciplina de Educação Ambiental, prevista na grade curricular do ensino fundamental de Araçatuba, atendendo à Lei de Diretrizes e Bases da Educação e à Política Nacional de Educação Ambiental. Por conta disso, “houve necessidade de adotar material para subsidiar o trabalho com os alunos e a formação adequada dos professores”.
Das argumentações apresentadas, o promotor ainda destaca que a secretaria realizou pesquisa para atender a suas demandas até chegar ao conteúdo produzido pela empresa Brasil Sustentável Editora, que disponibilizou exemplares de seus livros para análise e que o material foi avaliado com a finalidade de constatar se estava em conformidade com as políticas e terminologias ambientais vigentes. “Contando, inclusive, com parecer favorável de uma diretora de escola da rede municipal, que é doutora em educação ambiental pela Unesp”, destaca o promotor.
E observa que, mesmo assim, conforme informações que lhe foram passadas pela administração municipal, visando a economicidade e ampliação da concorrência. “A secretaria de Educação deu continuidade na busca por materiais que pudessem atender às demandas da rede, considerando a abordagem dos conteúdos de forma articulada e adequada à faixa etária dos alunos, com incorporação de novos significados sociais e científicos, bem como a necessidade de capacitação do corpo docente, porém, não se conseguiu encontrar nenhum outro material que atendesse às demandas explicitadas”, destaca Andrade.
O representante da Promotoria do Patrimônio Público observa: “Acrescentou que a empresa contratada, Brasil Sustentável Editora, detém exclusividade do material adquirido, conforme declaração da Câmara Brasileira do Livro, e que a Procuradoria Jurídica do Município emitiu parecer favorável à aquisição direta por inexigibilidade de licitação; quanto à pesquisa de preço, alegou que o material foi adquirido pelos mesmos valores que a empresa o comercializou em 2011 com outras prefeituras”.
PELO ARQUIVAMENTO
Em sua decisão, o promotor Luiz Antônio de Andrade diz que, pela notória escassez de material didático destinado à educação ambiental, é possível concluir que os kits adquiridos pela Prefeitura de Araçatuba apresentam característica singular que invibializa a competição entre empresas e torna inexigível o processo licitatório.
“Além disso, há declaração da Câmara Brasileira do Livro de que o material didático adquirido pela Prefeitura é de edição e publicação exclusiva, em todo o território nacional, da Brasil Sustentável Editora”, diz o promotor. “O material adquirido consiste em uma coletânea de livros didáticos de educação ambiental, todos publicados pela referida editora, e, consoante afirmou a secretária municipal de Educação, é adequado ao trabalho direto com os alunos de todos os anos do ensino fundamental, e que os demais materiais encontrados se resumem a jogos sobre o tema e livros avulsos, impossibilitando uma abordagem integrada e sequencial nos diversos anos do ensino fundamental, ou são materiais destinados apenas ao professor, para que ele próprio prepare o que será utilizado pelos alunos”.
Ainda de acordo com o arquivamento promovido por Luiz Antônio de Andrade, a a aquisição do material pela Prefeitura foi precedida de “criteriosa avaliação pedagógica pela diretora do Departamento de Educação da secretaria municipal, que analisou todos os livros enviados como amostras pela editora”.
De acordo com ele, a avaliação feita pela representante do governo municipal, ressaltando que “os materiais escolhidos apresentam fartas ilustrações, riqueza em informações, além de possuírem linguagem adequada, que tratam de temas ambientais atuais, tais como dengue, uso consciente da água como recurso natural e precioso, a necessidade de reciclagem e o uso da energia de forma correta, visando o desenvolvimento sustentável”, e acrescentou que o material analisado difere das obras enviadas às escolas pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), no Programa Nacional do Livro Didático.
Sobre a não realização de licitação, o promotor também se ampara nas alegações apresentadas pela administração municipal. “Por sua vez, a Procuradoria Jurídica do município aprovou a compra direta, por considerar presentes os requisitos para a inexigibilidade de licitação”, afirma. “Além da escassez de material didático no mercado, é possível constatar que os livros adquiridos também apresentam características de singularidade em razão da exclusividade do fornecedor, o que inviabiliza a competição e torna inexigível a licitação”.
Quanto à alegação de que a empresa contratada teria sido beneficiada com informações privilegiadas, uma vez que enviou orçamento à Prefeitura com o quantitativo certo de material a ser adquirido, o promotor diz que “é de se convir que a secretária municipal de Educação espancou as dúvidas suscitadas ao esclarecer que o orçamento foi solicitado com base no número de alunos”. Ele completa: “a decisão de adquirir o material diretamente da empresa Brasil Sustentável Editora foi precedida de avaliação técnica e pedagógica por agentes da secretaria municipal de Educação, e contou com parecer favorável da Procuradoria Jurídica do Município, não se vislumbrando, portanto, qualquer indício de má-fé capaz de viciar a conduta administrativa. Por conseguinte, não há elementos indicativos de improbidade administrativa”.
PREFEITO E SECRETÁRIA ‘COMEMORAM’
O prefeito de Araçatuba, Dilalador Borges, via assessoria de imprensa da Prefeitura, emitiu nota nesta sexta-feira se manifestando sobre o arquivamento da representação referente à compra de livros. “Eu estava tranquilo em relação à lisura da nossa administração. Tenho certeza que o certame foi estruturado e conduzido dentro dos parâmetros legais, pois confio em minha equipe formada por servidores competentes e probos das secretarias da Educação, Administração e Assuntos Jurídicos responsáveis diretos por este certame. Apesar dos comentários e críticas vindas de pessoas que desconheciam o processo e que queriam denegrir a imagem da nossa administração, continuamos nosso trabalho de edificação de uma Araçatuba que tem recebido e merece mais respeito com o bem público. Apresentamos ao respeitável Ministério Público todas as informações solicitadas certos da lisura de nossa conduta e aproveito para saldar este importante órgão que tem primado pela Justiça, laureando a quem trabalha com integridade em seus atos”, diz o tucano.
Já a secretária Silva de Sousa e Souza se manifestou no Facebook. “A decisão do MP é a prova de que quando existe lisura e transparência, não há o que temer. É direito de todo cidadão acionar o MP quando se deparar com um quadro de irregularidade, mas no caso da representação sobre a compra dos livros, foi um ato leviano e infundado com o simples propósito de denegrir um trabalho que é feito com tanta seriedade. Deus é justo”, disse.
VAI RECORRER
Tranquilo quanto ao posicionamento do MP de Araçatuba, o advogado Lindemberg Melo Gonçalves disse que vai recorrer da decisão do promotor Luiz Antônio de Andrade, que remeteu o caso ao Conselho Superior do Ministério Público, em São Paulo, para reexame.
“Nem a Prefeitura nem o Ministério Público conseguiram Justificar como se efetuar uma compra com dispensa de licitação para livros que contenham, associados ao tema meio ambiente, assuntos sobre esportes, conforme publicação feita em 2017, que fala que o Brasil vai sediar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Estamos em plena Copa do Mundo de 2018, alguma coisa há de errado nisso aí e ninguém, pelo visto, se importou com uma questão que é grave e que para mim se verifica uma queima de estoque”, afirma.
Lindemberg fala em arrependimento futuro. “O Ministério Público, daqui a três anos, vai se arrepender por não ter tomado providências hoje”, diz. Questionado por qual motivo, ele se explicou. “Vai se arrepender porque as ilegalidades e desperdício dos recursos públicos estão acontecendo hoje e não está havendo nenhuma providência judicial. Daqui três anos, o Tribunal de Contas vai declarar ilegal esta contratação e o Ministério Público, sob pena de prevaricação, será obrigado a entrar com uma ação que deveria fazer hoje”.