A terça-feira (22) tende a ser de caos na saúde pública de Araçatuba. De acordo com profissionais que trabalham nas UBSs (Unidades Básicas de Saúde) do município, até as 16h da tarde desta segunda-feira (21), a Organização Social Mahatma Ghandi, contratada pelo prefeito Dilador Borges (PSDB) para fazer a gestão de serviços no município, não havia assegurado o quadro necessário de profissionais, em especial dentistas e médicos, para atendimento à população.
A reportagem do site 018 News apurou que a entidade, que é ligada a um hospital espírita psiquiátrico de Catanduva, propôs na semana passada, poucos dias antes de assumir os serviços de Saúde na cidade, a contratação de médicos e dentistas por meio de pejotização, a chamada Pessoa Jurídica. A proposta não foi aceita pelos profissionais que até esta segunda-feira (21) trabalham ligados à ASF (Associação Saúde da Família), que faz a gestão dos serviços no município.
Não bastasse exigir que cada profissional funcione como uma empresa e terceirize seus serviços à Mahatma Ghandi – o que seria uma quarteirização das atividadews à administração municipal – a entidade também propôs o pagamento de salários inferiores ao piso de cada categoria.
Na proposta da Mahatma Ghandi, contida em áudios de uma reunião realizada na sede da empresa, na rua Abramo Gon, bairro Nossa Senhora Aparecida, na noite da última sexta-feira (18), à qual a reportagem teve acesso, um representante da OS, questionado sobre o salário proposto, inferior ao piso salarial de dentistas, disse que a quantia oferecida era o que estava no plano de trabalho apresentado à administração municipal.
A proposta salarial, excluindo a exigência de que cada profissional seja contratado como pessoa jurídica, fere o item 2.19 da Cláusula Segunda do Edital publicado pela Prefeitura, que estabelece as obrigações e responsabilidades do parceiro privado. Consta no documento público que a entidade contratada para fazer a gestão da saúde em Araçatuba deve “garantir o pagamento do piso salarial, qualquer que seja a categoria profissional”.
Mas não é com esse propósito que a Mahatma Ghandi chega a Araçatuba para fazer a gestão da saúde municipal ao custo de R$ 24.641.138,64 anuais, com contratação que pode ser prolongada pela administração municipal até completar 60 meses.
A Organização Social, que é sediada em Catanduva, mas tem o grosso de suas atividades no estado do Rio de Janeiro, com gestão de unidades nos municípios de Bangu, Ricardo Albuquerque, Realengo, Marechal Hermes, Paraíba do Sul, Volta Redonda, Mesquita, Itaboraí e Nilópolis. Além de Bebedouro (SP), e as cidades de Florianópolis e Mafra, em Santa Cataria; Alfredo Chaves, no Espírito Santo; e Carazinho, no Rio Grande do Sul.
No caso dos dentistas, um grupo de 22 profissionais que atuam nas UBSs de Araçatuba e desenvolvem na cidade um programa premiado de saúde bucal, o salário bruto da categoria, no caso o piso, é da ordem de R$ 8 mil, valor que cai para R$ 6,3 mil com os descontos de encargos.
Além de propor que tenham CNPJ para prestar serviços à população, a Mahatma Ghandi ofereceu um salário bruto de R$ 4.583,46. Infringindo claramente o que determina o edital da Chamada Pública de OS para a prestação de tais serviços, publicado pela Prefeitura.
No caso dos médicos que atenderão os doentes do município, a Mahatma Ghandi também fez a proposta de pejotização. Eles também teriam que ter CNPJ para atuar de forma terceirizada à entidade e “quarteirizada” à Prefeitura, o que configuraria uma ilegalidade segundo advogados trabalhistas ouvidos pela reportagem.
ATRAVESSADORA DE SERVIÇOS
A forma como a OS Mahatma Ghandi pretende contratar funcionários, para determinados quadros dos serviços que começa a prestar à população de Araçatuba a partir desta terça-feira, a coloca, na prática, no papel de uma atravessadora de mão de obra qualificada.
Para contratar profissionais por meio de Pessoa Jurídica, a Prefeitura de Araçatuba não precisaria de uma entidade que fizesse esta intermediação. Ela mesma poderia contratar diretamente, o que lhe sairia mais barato.
Questionada sobre a questão, a prefeitura de Araçatuba não se manifestou à reportagem do 018 News. Da mesma forma, desde a quarta-feira (16) da semana passada o site aguarda respostas a questionamentos feitos à própria Mahatma Ghandi, que silencia sobre indagações da imprensa, demonstrando arrogância em sua chegada a Araçatuba.
REPRESENTAÇÕES NO MP E TCE
A desobediência do que está previsto no edital da Prefeitura, de número 005/2019, pode levar o prefeito Dilador Borges a ser questionado por eventuais ilegalidades no processo de contratação da Organização Social. Os caminhos para isso, inicialmente, seriam O Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado.
No caso, sendo comprovado o descumprimento de uma cláusula prevista em edital, o prefeito pode responder por improbidade administrativa (desonestidade com o dinheiro público). E se for levantado qualquer indício de ilegalidade na aplicação de recursos da saúde, cuja maior parte é repassada pela União, Dilador pode voltar a se tornar alvo da Polícia Federal.
Vale lembrar que, por problemas na contratação de Organização Social para gestão de serviços de Assistência Social, o tucano é alvo de procedimento investigatório em trâmite no TRF3 (Tribunal Regional Federal da Terceira Região). A apuração é decorrente de indícios de desvio de dinheiro público encontrados pela Polícia Federal em contratos firmados pela Prefeitura com o IVVH (Instituto de Valorização à Vida Humana), registrado em nome de laranjas do sindicalista e empresário José Avelino Pereira, vulgo Chinelo, que teria um faturamento mensal de mais de R$ 100 mil por esquema na prestação de serviços à Prefeitura.
O caso está sob investigação, após a deflagração da Operação #TUDONOSSO, em 13 de agosto, que levou à cadeia na ocasião 15 pessoas, sendo quatro delas ocupantes de cargos comissionados na Prefeitura de Araçatuba. Por ter foro privilegiado, o prefeito Dilador Borges é investigado no TRF3 e ainda não está livre de um possível envolvimento com o esquema desbaratado pela PF.