
Depoimento de um dos presos da Operação #TUDONOSSO, deflagrada em 13 de agosto pela Polícia Federal, com a finalidade de desbaratar esquema criminoso envolvendo contratos firmados pela Prefeitura de Araçatuba com empresas ligadas por meio de “laranjas” ao empresário e sindicalista José Avelino Pereira, vulgo Chinelo, coloca o prefeito Dilador Borges (PSDB) como participante de um acordo político que teria rendido a ele repasse de R$ 400 mil durante a campanha para a eleição municipal de 2016, da qual saiu vitorioso para comandar o município do início de 2017 até o final de 2020.
A informação consta em depoimento prestado à Polícia Federal por João Vítor Custódio Carinheno, 23 anos, sobrinho de Chinelo e, até 13 de agosto, encarregado financeiro do IVVH (Instituto de Valorização à Vida Humana), entidade contratada pela Prefeitura de Araçatuba no início de 2018 para gerenciar programas ligados à secretaria de Assistência Social do município.
O IVVH é, segundo a Polícia Federal, uma das empresas registradas em nomes de “laranjas” comandados por Chinelo para desviar dinheiro público. O instituto foi contratado pela Prefeitura como único participante de uma chamada pública de organizações sociais interessadas em fazer a gestão dos serviços de assistencialismo prestados à população.
Por dez meses de atuação, no ano de 2018, a Prefeitura firmou compromisso com o IVVH no valor de R$ 8.082.094,24. Em dezembro do mesmo ano, a parceria foi renovada por mais 12 meses de atuação do instituto na administração municipal, só que ao custo de R$ 8.898.636,13 pelo período.
O volume de dinheiro destinado pela Prefeitura ao IVVH é a fatia mais grossa de uma parceria entre a atual administração e empresas ligadas a Chinelo, registradas sempre em nomes de “laranjas”. Uma de três contratações feitas pela Prefeitura que movimentaram, segundo a PF, até o dia da operação, recursos da ordem de R$ 15 milhões, com um faturamento mensal de cerca de R$ 120 mil para o grupo classificado como criminoso pela polícia e comandado pelo sindicalista.
Logo no início de sua administração, Dilador, com aval da vice Edna Flor (Cidadania), contratou sem licitação a empresa Bolívia Comércio de Materiais de Limpeza Ltda. A parceria se deu em caráter emergencial, para a execução de limpeza de escolas da rede municipal de ensino a um custo de R$ 3.029.400,00 por seis meses.
Já em dezembro de 2018, o governo de Dilador Borges e Edna Flor deu mais uma cartada parceria com o grupo de Chinelo. Para substituir a Bolívia, na limpeza da Prefeitura e prédios públicos, a administração municipal contratou a SEN Prestação de Serviços Ltda., por mais R$ 1.525.000,00.
Os contratos com o IVVH e a SEN continuam em andamento, mesmo com a deflagração da operação da Polícia Federal e a prisão de 15 pessoas na ocasião. Entre elas, Chinelo, o filho dele, Igor Tiago Pereira, que é presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Itatiba e um dos donos da SEN, quatro servidores municipais ocupantes de cargos comissionados nomeados por Dilador e ligados ao grupo criminoso, além do sobrinho João Vítor, que fez o relato do acordo de R$ 400 mil em seu depoimento à PF.
O QUE DIZ O PARENTE DE CHINELO
João Vítor Custódio Carinheno foi preso preventivamente no dia 14 de agosto, um dia após a deflagração da #TUDONOSSO. Ele se entregou à Polícia Federal após não ter sido localizado no dia em que agentes foram às ruas cumprir mandados de busca e apreensão por conta dos contratos firmados pela Prefeitura com o grupo do sindicalista.
Como encarregado financeiro do IVVH, João Vítor foi alvo de um extenso interrogatório após se apresentar na delegacia da PF em Araçatuba. Foram direcionadas a ele 154 perguntas sobre a figura de Chinelo, que é seu tio, e também sobre empresas ligadas ao grupo que prestam serviços à Prefeitura e também ao IVVH, numa espécie de quarteirização de serviços.
Ele associa financeiramente o prefeito Dilador Borges ao tio, José Avelino Pereira, logo na sexta pergunta feita pela PF: “Sabe informar se José Avelino possui algum tipo de acordo político com a atual administração municipal, bem como administrações passadas, no sentido de facilitar o acesso das empresas relacionadas a ele a contratos com a administração”, questiona a polícia.
João Vítor responde que “sim” e diz que tem conhecimento de um acerto entre as partes que está em processo de investigação pela PF. “O acordo seria de que forneceria, aproximadamente, Quatrocentos Mil Reais na campanha de Dilador e Edna Flor para que suas empresas tivessem acesso e facilidades a serviços públicos, dentre eles, facilitações nos certames licitatórios”.
Além de relatar à polícia o esquema de facilitação, com o acordo financeiro de R$ 400 mil que está em processo de apuração, o encarregado financeiro do IVVH confirmou que outras empresas ligadas ao tio foram contratadas pelo instituto. Entre elas, a Vipig, na locação de veículos, e a própria SEN para serviços de limpeza.
É INVERDADE, DIZ ASSESSORIA
O depoimento de João Vítor é apenas a ponta de um novelo que está há mais de dois anos sendo desembaraçado pela Polícia Federal. Por se tratar de um agente político, tudo que a Polícia Federal apurou até o momento sobre a figura do prefeito Dilador Borges está sob sigilo judicial.
Na condição de prefeito, Dilador tem o chamado foro privilegiado. O que obriga as entidades policiais a remeterem tudo que, neste caso, se relaciona a sua pessoa, para o TRF3 (Tribunal Regional da Terceira Região), onde há inquérito aberto para acompanhar os procedimentos investigatórios, juntar eventuais provas e, no futuro, levar a uma possível denúncia contra o chefe do Executivo ou arquivamento de tudo que possa afetar sua pessoa no que diz respeito às investigações das contratações de empresas comandadas pelos laranjas de Chinelo.
Independente do que pode resultar a apuração em tela sobre a figura do atual prefeito de Araçatuba, a reportagem do 018 News questionou a assessoria de imprensa da Prefeitura sobre as declarações do sobrinho de Chinelo, afirmando ter conhecimento de um acordo financeiro que teria sido praticado durante a campanha eleitoral de 2016.
A assessoria, quando questionada, deixou claro que já tinha conhecimento da informação, parte de um inquérito policial que tem, até o momento, 2.295 páginas divididas em dez volumes de documentos, depoimentos, relatórios de bens apreendidos, tramitações judiciais e provas que podem incriminar um grupo investigado que é formado por 28 pessoas, das quais 15 já chegaram a ser presas.
“Trata-se de depoimento isolado, e não conta com nenhum respaldo material ou testemunhal. A informação passada é inverídica”, resumiu a assessoria do prefeito Dilador Borges, sobre o que declarou à PF o próprio sobrinho de Chinelo, pessoa que, se firmou ou não acordo financeiro com o chefe do Executivo, pelo menos o apoiou politicamente no pleito eleitoral de 2016.
VEJA PARTE DO DEPOIMENTO DE JOÃO VITOR À POLÍCIA FEDERAL: